segunda-feira, 24 de setembro de 2012

"RECESSO BRANCO"



COMENTÁRIO

SEMPRE O RECESSO BRANCO

Há quem defenda que as campanhas eleitorais sejam financiadas com dinheiro público. O argumento é de que só assim a política seria moralizada, pois partidos e candidatos não precisariam recorrer às doações privadas, mãe da corrupção que grassa desvairada na teia de compromissos espúrios que passa a envolver os eleitos com seus doadores. Mas a verdade é que as campanhas já são, na prática, financiadas com dinheiro público. Doações privadas, de modo geral, apenas suplementam as fortunas que saem do erário a título de contribuição para o exercício da democracia. Para caracterizar o já existente financiamento público de campanhas, existe o Fundo Partidário dinheiro que sai do Orçamento diretamente para os cofres dos partidos. Somente em 2012, milhões de reais tomam este destino, com uma curiosidade esdrúxula: boa parte do Fundo é constituída por multas aplicadas pela Justiça Eleitoral contra quem infringiu a legislação. Ou seja: quanto mais os partidos e seus candidatos descumprirem as leis, maior é o volume de recursos que recebem! Mas não para aí o escândalo do financiamento público direto das campanhas. Há também o indireto, ainda mais atentatório à consciência dos cidadãos e dos contribuintes. Estamos diante de um caso desses neste exato momento: deputados estaduais no período em que antecede as eleições municipais de forma natural “estabeleceram” uma espécie de “recesso branco” para cumprir agendas de campanha em suas bases eleitorais, quer disputando eles próprios (inclusive o seu presidente), para apoiar correligionários que concorrem às prefeituras e câmaras municipais. Neste sentido à atividade parlamentar foi reduzida ao mínimo, limitando-se à apreciação de projetos de pouca relevância. Segundo quase todos os deputados dizem que por esta ação seria compreendido pela sociedade. – Certo seria que a sociedade talvez compreendesse os deputados se eles deixassem de receber durante o período em que não trabalhassem como na iniciativa privada, em que funcionários podem tirar licenças não remuneradas quando há um motivo relevante. Apesar de, no caso dos parlamentares, ser possível questionar a existência de tais motivos, especialmente para os deputados que não disputam a eleição e se ausentam da Assembleia apenas para ajudar aliados. Já no caso dos parlamentares candidatos, poderíamos comparar sua situação à de um trabalhador que pedisse licença não remunerada para procurar um novo emprego, com a garantia de retornar ao posto caso a busca fosse infrutífera. Cabe a cada um avaliar se esse seria um motivo relevante ou não. Mas não: a espécie de “recesso branco” não implicará nenhum tipo de desconto. Os deputados receberão normalmente o salário pago com dinheiro religiosamente recolhido aos cofres públicos pelos contribuintes-eleitores. Quando terminar a nova folga, os deputados terão recebido integralmente por praticamente um mês inteiro de inatividade parlamentar. Um prejuízo tão imoral quanto financeiro é o descumprimento das funções legislativas de que estão constitucionalmente encarregados os deputados, eleitos pelo voto popular para honrar o “soberano” a que se propuseram (e juraram cumprir) quando disputaram suas eleições. É um prejuízo não contabilizado monetariamente, mas é, sem dúvida, uma demonstração do desprezo que os políticos devotam aos próprios mandatos, à instituição a que pertencem e à população que os elegeu.
Antônio Scarcela Jorge

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